terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Garantismo Penal do Século XX

 O garantismo estudado aqui é o garantismo do século XX. O garantismo clássico é do século XVIII, de quando os iluministas desenharam um modelo de intervenção penal com respeito aos direitos e garantias. Quando há um modelo penal que observa direitos e garantias, esse é um modelo garantista. O modelo garantista se inicia a partir do momento em que há um Direito Penal com princípios que objetivam a contenção do poder punitivo. Quando há princípios que objetivam a contenção do poder punitivo, há também, indubitavelmente, um catálogo de direitos e garantias para os cidadãos.

No final do século XX, em 1989, Luigi Ferrajoli escreveu o livro Direito e Razão, com o subtítulo Teoria do Garantismo Penal. Esse livro tornou-se uma grande referência do que viria a ser chamado de garantismo penal ou garantismo penal neoclássico. Ferrajoli desenhou um sistema garantista em que haveria um catálogo de direitos mínimos e esse catálogo estaria na esfera do não decidível.

A esfera do não decidível é uma pequena esfera de direitos que não estão em discussão, nem mesmo pela totalidade de pessoas. É importante lembrar que a democracia não é apenas o governo da maioria. O governo da maioria em que a maioria decide matar a minoria, por exemplo, não é uma democracia, mas uma ditadura da maioria. Em uma democracia, é necessário respeitar a opinião da maioria, mas preservar uma esfera de direitos da minoria. Não poderia haver, por exemplo, um plebiscito para decidir se a maioria pode escravizar a minoria. Ainda que 90% das pessoas votassem que sim, isso não seria democrático, pois é necessário preservar uma esfera mínima de direitos que Ferrajoli chama de esfera do não decidível.

Ferrajoli desenhou postulados que caracterizariam o sistema garantista. Haveria dez postulados do sistema garantista e, nesses postulados, haveria um sistema mais ou menos garantista, ou seja, quanto maior a observância dos postulados, mais garantista seria o sistema, e quanto menor a observância dos postulados, menos garantista seria o sistema. Os seis primeiros postulados são de Direito Penal e os quatro subsequentes são de Direito Processual Penal.

a. Não há pena sem crime:

 Esse é o princípio da exteriorização do fato. Se não for praticado o fato e ele ainda estiver sendo cogitado, não é possível considerá-lo como crime, logo, não há pena sem crime. Na visão de Ferrajoli, as contravenções penais seriam inconstitucionais, pois violariam o princípio da subsidiariedade do Direito Penal. Se há contravenção penal, é porque o Estado está reconhecendo que o fato não é tão grave – pois, se fosse grave, seria considerado crime. Não sendo grave, seria possível abdicar do Direito Penal e aplicar outras instâncias de controle. Por isso, na visão de Ferrajoli, as contravenções penais são violadoras do princípio da subsidiariedade.

b. Não há crime sem lei:

Não há crime sem lei anterior que o defina, não apenas sem prévia cominação legal. Esse é o princípio da legalidade.

c. Não há lei sem necessidade 

Trata-se do princípio da intervenção mínima.

d. Não há necessidade sem lesão/ofensa 

Trata-se do princípio da lesividade. Não há necessidade da lei penal se não houver ofensa a bem jurídico.

e. Não há lesão sem ação 

A ação positiva é a ação propriamente dita e a ação negativa é a omissão. Não há lesão sem a conduta humana penalmente relevante.

f. Não há ação sem culpabilidade:

Trata-se do princípio da culpabilidade.

g. Não há culpabilidade sem processo 

Trata-se do princípio da jurisdicionalidade ou princípio da necessidade do processo. Somente é possível haver a aplicação de uma pena se houver um processo penal. Não há como reconhecer a culpabilidade que irá gerar a aplicação de uma pena sem haver processo penal.  

h. Não há processo sem autor 

Trata-se do sistema acusatório. O juiz não pode iniciar o processo penal. Quem acusa não julga e quem julga não acusa. Não há processo sem autor/acusação. Antes da Constituição de 1988, existia o procedimento judicialiforme, que era um processo penal iniciado de ofício pelo próprio juiz.

i. Não há autor sem provas

 Trata-se do princípio da inocência, ou seja, a distribuição do ônus da prova é para a acusação. Cabe à acusação o ônus de provar a culpabilidade do réu, não ao réu provar sua inocência.

j. Não há provas sem defesa 

Trata-se do direito de ampla defesa, ou seja, direito de a defesa se pronunciar sobre as provas que são produzidas. Esses são os dez postulados que formam o sistema garantista. Essas garantias são mínimas. Tendo o sistema garantista a observância de mais ou menos postulados, ele será mais ou menos garantista na visão de Ferrajoli.

 O professor Douglas Fisher defende a ideia de que, no Brasil, é feita uma interpretação do garantismo de Ferrajoli muito voltada para o réu. O garantismo interpretado no Brasil, portanto, seria um garantismo hiperbólico monocular. 

O garantismo hiperbólico monocular é uma crítica feita por alguns autores brasileiros à forma como é interpretada e aplicada a doutrina de Ferrajoli no Brasil. Esses autores entendem que a interpretação brasileira tende, exclusivamente ou quase exclusivamente, à observância dos direitos do réu, mas, na verdade, a doutrina de Ferrajoli também depende da observância dos direitos da vítima (individual ou coletiva).

Obs.: “Hiperbólico” significa “superdimensionado” e “monocular” significa que a interpretação considera apenas os direitos do réu. 

Por isso, a doutrina no Brasil defende a implantação de um garantismo penal integral, que observe não apenas os direitos do réu, mas os direitos da sociedade e da vítima. Os críticos a essa teoria no Brasil afirmam que, na verdade, essa é uma invenção brasileira, pois a teoria de Ferrajoli já contempla esse ponto e não seriam necessárias outras tecnologias. 

Ferrajoli não era abolicionista, mas um crítico do abolicionismo que defendia a existência de um sistema punitivo e a observância não apenas da vedação ao excesso punitivo, mas também da vedação à proteção insuficiente ou deficiente. Os críticos, por isso, afirmam que não seria necessário criar novas tecnologias como o garantismo hiperbólico monocular, pois o garantismo penal propriamente dito de Ferrajoli já contemplaria todas essas hipóteses.

Concurso MP RO Promotor publicado! Inicial R$ 32,3 mil!

O edital do concurso do Ministério Público de Rondônia, MP RO Promotor, já foi divulgado pela Fundação Vunesp. São disponibilizadas cinco vagas imediatas, além da formação de cadastro de reserva, com pagamentos iniciais de R$ 32,3 mil, acrescidos de benefícios.

Auxílios recebidos:

Os profisionais também recebem:

Auxílio-Alimentação (R$ 1.773,11),

Auxílio-Saúde (R$ 2.888,42) e

Auxílio Odontológico3.

 As inscrições poderão ser feitas de 4 de janeiro a 8 de fevereiro de 2024, exclusivamente pela internet, por meio do site da banca organizadora. A prova objetiva está marcada para o dia 7 de abril de 2024.


Resumo: Inquérito Policial

  Conceito O Inquérito Policial (IP) é um procedimento administrativo conduzido pela polícia judiciária para apuração preliminar da prática ...