terça-feira, 21 de junho de 2022

AÇÃO DE RITO COMUM (REVISIONAL) COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA

 

Ao Juizo de Direito da Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro – a quem a presente demanda vier a ser distribuída.

 

 

 

 

 

    JOAO XXXXXXXXX e PATRICIA XXXXXXXX, brasileiros, casados entre si, ele advogado, ela analista de sistemas, respectivamente inscritos no CPF/MF sob os nºs. 083.xxxxxx – xx e 074.xxxxxx – xx, residentes e domiciliados na xxxxxxxxxxxxxx, nº 300, apto 20, bloco xx, Edifício Salt Lake, freguesia de Jacarepaguá, Estado do Rio de Janeiro, o primeiro autor advogando em causa própria e na representação da segunda demandante, com endereço profissional sito na Avenida Almirante Barroso, nº 06, sala 509, Centro, município e Estado do Rio de Janeiro, local em que receberá as intimações que se fizerem necessárias, endereço eletrônico xxxxxxxx, vem, por meio desta, com fundamento no art. 319 e seguintes do CPC, no art. 422 e seguintes do CC, no art. 1º e seguintes do CDC, e nos demais dispositivos legais aplicáveis à matéria, propor

 

AÇÃO DE RITO COMUM (REVISIONAL) COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA

 

contra a CYRELA RJZGONTIJO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 09.465.200/0001 – 94, sediada na Avenida Engenheiro Roberto Zuccolo, nº 555, sala 1001, no bairro da Vila Leopoldina, município e Estado de São Paulo, de acordo com as razões de fato e de direito adiante aduzidas:

 

DOS FATOS

 

01.  Conforme percebemos por meio da simples análise do documento em anexo, no dia 27.2.2018, as partes celebraram INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE UNIDADE AUTÔNOMA CONDOMINIAL E OUTRA AVENÇAS, tendo por objeto o apartamento 20, do bloco xxx, do Edifício Salt Lake, localizado na Av. Flamboyants da Península, nº xxxx, freguesia de Jacarepaguá, Estado do Rio de Janeiro, cujas medidas e confrontações se encontram perfeitamente descritas e caracterizadas na matrícula nº 368.049, do 9º Ofício do Registro de Imóveis.

 

02.  O preço da compra e venda foi estipulado em R$ 1.700.000,00 (um milhão e setecentos mil reais), sendo R$ 340.000,00 (trezentos e quarenta mil reais) pagos a título de sinal, e o saldo remanescente, de R$ 1.359.900,00 (um milhão trezentos e cinquenta e nove mil e novecentos reais), mediante financiamento, contraído diretamente com a construtora, sem qualquer intervenção de integrantes do SFH – SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO.

 

03.  Vejamos o que dispõe o item III.2 do instrumento contratual:

 

“III.2 – SALDO DO PREÇO, ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E FORMA DE PAGAMENTO

III.2.1 – O saldo devedor do preço, sujeito à correção monetária adiante estipulada de comum acordo entre os contratantes, deverá ser paga pelo(as) COMPRADOR ao VENDEDOR da seguinte forma:

REAJUSTÁVEL COM JUROS:

R$ 1.359.900,00 (um milhão trezentos e cinquenta e nove mil e novecentos reais) através de 01 (uma) única parcela no valor de R$ 1.327.803,81 (um milhão trezentos e vinte e sete mil oitocentos e três reais e oitenta e um centavos), já acrescida de juros calculados pela Tabela Price, à razão de 12% (doze por cento) ao ano, contados de 01/04/2018, vencendo-se em 01/05/2018, denominada de ‘Parcela de Financiamento’, uma vez que seu pagamento, salvo se o COMPRADOR optar por pagá-la à vista na data de seu vencimento, deverá ser necessariamente financiada pela instituição financeira que venha a financiar o Empreendimento ou por outra

Qualquer da livre escolha do COMPRADOR, pois é certo que o VENDEDOR não se compromete a financiar esta parte do saldo do preço.

R$ 100,00 (cem reais) a ser pago em uma única parcela de R$ 139,17 (cento e trinta e nove reais e dezessete centavos) já acrescidas de juros, calculados pela tabela Price, à taxa de 12% (doze por cento) ao ano, vencendo-se em 01/03/2021.

Incidirá correção monetária sobre a totalidade do saldo do preço, em todas as parcelas, conforme previsto neste instrumento. Desta forma, a correção monetária será computada a partir do primeiro dia do mês da data de assinatura deste instrumento, tomando-se como base sempre o índice do segundo mês anterior ao do vencimento da parcela, de acordo com os índices previstos nas cláusulas 2.3.3 e seguintes.

Além da correção monetária que incide sobre a totalidade do saldo do preço, todas as parcelas mencionadas neste item estão acrescidas de juros calculados pela Tabela Price, à taxa de 12% (doze por cento) ao ano”.

 

04.  No mesmo contrato, as partes previram a possibilidade de pagamento da parcela de R$ 1.359.900,00 (um milhão trezentos e cinquenta e nove mil e novecentos reais) à vista, no dia 1.5.2018, ou através de financiamento “a ser concedido pela VENDEDORA”, neste caso, a ser adimplido da seguinte forma:

 

a)   R$ 543.313,00 (quinhentos e quarenta e três mil trezentos e treze reais), em 100 (cem) parcelas mensais e sucessivas, cada uma na quantia histórica de R$ 5.433,13 (cinco mil quatrocentos e trinta e três reais e treze centavos), já acrescidas de juros calculados pela tabela Price, à taxa de 12% (doze por cento) ao ano, a primeira com vencimento no dia 1.5.2018, e as demais no mesmo dia dos meses subsequentes, até o final da liquidação.

b)   R$ 1.048.883,81 (um milhão quarenta e oito mil oitocentos e oitenta e três reais e oitenta e um centavos), através de uma parcela, já acrescida de juros calculados pela tabela Price, à taxa de 12% (doze por cento) ao ano, com vencimento no dia 31.8.2018.

 

05.  No que se refere à definição do índice “escolhido” para a atualização da parte reajustável, vejamos o que dispõem os itens 2.3.3.1 e 2.3.3.2.2 do instrumento:

 

“2.3.3.2.1 – ATUALIZAÇÃO DA PARTE REAJUSTÁVEL (IGP-M, COM JUROS DE 12% AO ANO) – O saldo de preço a partir do mês seguinte à assinatura do presente contrato, serão atualizados pela variação do IGM-M (Índice Geral de Preços ao Mercado), publicado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), pelo critério ‘n-2’ acima esclarecido, acrescidos de juros compensatórios à base de 12% (doze por cento) ao ano”.

 

“2.3.3.2.2 TABELA PRICE – Todas as parcelas do saldo do preço já estão acrescidas de juros, calculados pela tabela Price, à taxa de 12% (doze por cento) ao ano, contados a partir do primeiro dia do mês vigente”.

 

06.  Além dessas disposições, o item 2.11.1 do instrumento contratual previu que os peticionários se sujeitariam ao pagamento de multa, na importância correspondente a 2% (dois por cento) sobre o valor corrigido, e de juros de mora de 1% (um por cento), contados dia a dia, em caso de impontualidade no adimplemento de qualquer das parcelas avençadas.

 

07.  Com base nas normas destacadas nesta manifestação processual, e como os autores optaram pelo pagamento do restante do preço através de financiamento, contraído com a própria ré, esta cobrou mensalmente a correção monetária, aplicando 1% (um por cento) de juros sobre o saldo devedor.

 

08.  Em outras palavras, a ré praticou a denominada “capitalização composta” no financiamento concedido aos autores, igualmente aplicando juros compostos no cálculo da dívida, escalonando o valor a ser pago de forma progressiva, corrigindo-o mensalmente, quando a correção deveria ser anual.

 

09.  Em decorrência dos fatos, os peticionários contrataram profissional especializado na realização de perícias, cálculos judiciais e extrajudiciais, resultando na elaboração de laudo.

 

10.  Nesse documento, e no que toca à metodologia adotada, o profissional contratado calculou a evolução da dívida pelo método simples, excluindo a capitalização de juros compostos, como também os reajustes mensais, que foram alterados para reajustes anuais.

 

11.  No Quadro VI do laudo particular, identificado como DIFERENÇA DAS PRESTAÇÕES PAGAS A MAIOR PELO AUTOR, observamos que, de maio de 2018 até a presente data, os peticionários pagaram R$ 133.715,31 (cento e trinta e um mil setecentos e quinze reais e trinta e um centavos) a mais do que deveriam ter pago, em apenas 28 (vinte e oito) meses.

 

12.  Além disso, o mesmo Quadro demonstra que a prestação que atualmente deveria estar sendo paga é de R$ 5.194,97 (cinco mil cento e noventa e quatro reais e noventa e sete centavos), quase 2 (duas) vezes o valor cobrado pela ré, que em agosto do ano em curso foi de absurdos R$ 10.082,51 (dez mil oitenta e dois reais e cinquenta e um centavos).

 

13.  Como verificamos, a adversa parte instituiu regras como se fosse uma instituição atrelada ao Sistema Financeiro da Habitação, como se pudesse corrigir mensalmente o saldo devedor e cobrar juros compostos.

 

14.  Mantidas a equação e a técnica, os peticionários jamais conseguiriam pagar o valor correspondente ao preço do bem, enquanto que a adversa parte receberia muito mais do que deveria receber, repita-se, como se fosse instituição financeira, coisa que não é.

 

DO DIREITO

 

15.    Como é do conhecimento geral, multiplicam-se no Brasil ações revisionais de contratos de financiamento de imóveis, fato que é público e notório.

 

16.  Contudo, a grande maioria dessas ações versam sobre questão relativamente pacificada na jurisprudência, sobre a possibilidade de as instituições financeiras que concedem os créditos calcularem as prestações mensais e o saldo devedor com base em índice mensal de correção monetária, bem assim, de inserirem cláusulas nos contratos celebrados com particulares, tomadores dos mesmos empréstimos, prevendo a pactuação de capitalização de juros com periodicidade igualmente mensal.

 

17.  Em outras palavras, é de se reconhecer que, quando o contrato é celebrado entre instituições financeiras vinculadas ao Sistema Financeiro Nacional (SFN) e o tomador do empréstimo, o entendimento majoritário é de que aquelas podem praticar a denominada “capitalização composta” nas operações de crédito, sobretudo com fundamento no art. 5º da MP 2170/2001, no art. 15-A da Lei nº 11.977/2009 e nas Súmulas 539 e 596 do STF e 541 do STJ, adiante transcritas:

 

“Art. 5º Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”.

 

“Art. 15-A. É permitida a pactuação de capitalização de juros com periodicidade mensal nas operações realizadas pelas entidades integrantes do Sistema Financeiro de Habitação (SFH)”.

 

“Súmula 539. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31.3.2000, desde que expressamente pactuada

 

“Súmula 596. As disposições do Decreto 22.626/1933 se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional”.

 

“Súmula 541. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada”.

 

18.  Contudo, no caso submetido à apreciação desse douto Julgador, não estamos falando de relação contratual estabelecida entre adquirente e instituição financeira vinculada ao SFH, mas de negócio jurídico pactuado entre adquirente (consumidor) e empresa privada, não vinculada ao SFH.

 

19.  Por isso, no julgamento da demanda sub examine, não é de se cogitar a aplicação das normas e das súmulas reproduzidas, pois a capitalização de juros e o cálculo da correção monetária com periodicidade inferior à anual não é permitida nas relações que envolvem consumidores e instituições privadas, repita-se, não vinculadas ao SFH.

 

20.  Diferentemente, o caso concreto deve ser julgado com base nos arts. 4º, 5º e 11 da Lei de Usura, adiante transcritos:

 

“Art. 4º É proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano”.

 

“Art. 5º Admite-se que pela mora dos juros contratados estes sejam elevados a 1% e não mais”.

 

“Art. 11. O contrato celebrado com infração desta lei é nulo de pleno direito, ficando assegurado ao devedor a repetição do que houver pago a mais”.

 

21.  Além dessas normas, merece destaque o § 1º do art. 2º da Lei nº 10.192/2001, in verbis:

 

“Art. 2º É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano. § 1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano. Omissis” (grifamos).

 

22.  Como se não bastasse, considerando que induvidosamente nos encontramos diante de relação de consumo, é evidente a necessidade de aplicação de normas do CDC, com destaque para os seguintes artigos:

 

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: Omissis. IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; omissis; VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência. Omissis”. 

 

“Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: Omissis; IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; omissis; XIII - aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido”.   

 

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”.

 

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: Omissis; IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; omissis; XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; omissis. § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. § 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes. § 3° (Vetado). § 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes”.

 

23.  No âmbito da jurisprudência, nossos Tribunais pacificaram o entendimento de que as cláusulas que preveem a possibilidade de aplicação de juros e de correção monetária mensalmente SÃO NULAS DE PLENO JURE, como percebemos por meio da leitura dos seguintes julgados:

 

“AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA – CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS – IMPOSSIBILIDADEIncorporadora de empreendimentos imobiliários não integra o sistema financeiro imobiliário. Revisão do julgado. Necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório. Súmula 7 desta Corte. Agravo conhecido para não conhecer do recurso especial” (Agravo em REsp 1.373.428 – MG, STJ, relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, decisão monocrática proferida no dia 28.2.2019) (grifamos).

 

“Ação de revisão de contrato de compra e venda de imóvel. Financiamento imobiliário regulado pela Lei Federal nº 9.514/97. Incidência do Código de Defesa do Consumidor. Competência do domicílio do autor. Inépcia da inicial afastada. Capitalização de juros não autorizada. Vendedora não integrante do sistema financeiro nacional. Ainda que o negócio jurídico travado entre as partes esteja regulamentado por lei específica (9.514/97), restando configurada a relação de consumo, nos termos do que estabelecem os arts. 2º e 3º do CDC, devem ser observadas as normas protetivas daquele microssistema jurídico, naquilo que não conflitar a norma especial de regência. Fundada a demanda em direito obrigacional decorrente de contrato de compra e venda firmado entre as partes litigantes, descarta-se a incidência da regra do art. 47 do Código de Processo Civil. Independentemente do foro de eleição previsto no contrato, ajuizada a demanda, pelo consumidor, no foro do seu domicílio, deve prevalecer a sua manifestação de vontade, em prestígio ao direito básico de facilitação da sua defesa (art. 6º, inciso VIII, do CDC). A petição inicial só deve ser indeferida por inépcia quando o vício verificado apresentar gravidade tal que impossibilite a defesa do réu, ou a própria prestação jurisdicional. As construtoras/loteadoras não se equiparam às instituições financeiras, razão pela qual, relativamente aos contratos de financiamento imobiliário (Lei 9.514/97), a elas não se estende a autorização para a capitalização mensal de juros a que se refere o art. 5º da medida provisória 2170-36/2001. Desprovido o recurso, de rigor o arbitramento de honorários recursais. Apelação Cível desprovida” (Apelação Cível 04321319720178090051, TJGO, publicado em 24.6.2019) (grifamos).

 

24.  Os julgados reproduzidos se encaixam tal como uma luva ao caso concreto, já que o contrato celebrado entre as partes prevê (quando não poderia) que a correção monetária e os juros incidem e são calculados mensalmente, quando, repita-se mais uma vez, a adversa parte é pessoa jurídica de direito privado, não vinculada ao SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL.

 

25.  A técnica engendrada pela ré vem prejudicando centenas e centenas de consumidores, dentre eles os peticionários, infringindo o princípio da boa-fé objetiva (art. 422 do CC: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”), que deve nortear o comportamento dos contratantes na fase pré-contratual e durante toda a execução do contrato.

 

26.  Ao invés de adotar comportamento que garantisse a observância ao mencionado princípio, a ré “sangrou” os peticionários em mais de R$ 100.000,00 (cem mil reais), e “sangraria” muito mais, não fosse a iniciativa destes de ajuizarem esta ação, confiando na hercúlea intervenção do Poder Judiciário.

 

DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA

 

27.  Como é do conhecimento desse douto togado, a concessão da tutela provisória de urgência está condicionada à comprovação do preenchimento dos requisitos abrigados pelo art. 300 da lei processual, quais sejam: a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

 

28.  No que toca ao primeiro requisito, é inegável a sua presença no caso em exame, na medida em que os peticionários comprovaram que a adversa parte não está vinculada ao SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL, sendo mera incorporadora privada, e que a lei proíbe a cobrança de correção monetária e de juros mensalmente, de forma capitalizada e composta.

 

29.  Nessa toada, vejamos a relação das instituições que estão legalmente autorizadas a operar no SFI – SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO, mediante a simples leitura do art. 2º da Lei 9.514/1997, eliminando qualquer dúvida sobre a possibilidade da ré de cobrar juros e correção monetária como cobram as instituições identificadas no mesmo dispositivo:

 

Art. 2º Poderão operar no SFI as caixas econômicas, os bancos comerciais, os bancos de investimento, os bancos com carteira de crédito imobiliário, as sociedades de crédito imobiliário, as associações de poupança e empréstimo, as companhias hipotecárias e, a critério do Conselho Monetário Nacional – CMN, outras entidades”.

 

30.  Além disso, os peticionários também comprovaram que o posicionamento jurisprudencial aplicável à matéria é firme e consolidado, sendo reiterado o julgamento de ações semelhantes pela procedência dos pedidos, resultando no reconhecimento da nulidade de cláusulas contratuais e na modificação de instrumentos particulares.

 

31.  No que se refere ao perigo de dano, está igualmente comprovado, na medida em que a não concessão da tutela provisória autorizaria a adversa parte a considerar o contrato rescindido, e a realizar a alienação extrajudicial do imóvel adquirido pelos autores (item 2.11.2.3 do contrato celebrado entre as partes), sem falar na inclusão dos nomes destes em cadastro pejorativo, maculando o seu conceito.

 

32.  A tutela provisória se restringe à autorização para o depósito judicial do valor mensal das prestações, de acordo com os cálculos realizados pelos profissionais contratados pelos autores, evitando a caracterização da sua mora, e a incidência das demais consequências identificadas no parágrafo anterior.

 

DOS PEDIDOS

 

33.  Pelo exposto, demonstrado que a pretensão dos autores está afinada com a lei, com a doutrina e com a jurisprudência, estes requerem se digne Vossa Excelência a:

 

a)   Conceder TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA, autorizando-os a realizarem o depósito judicial das prestações mensais, sob a sua conta e risco, com a incidência de juros e de correção monetária calculadas anualmente, não mensalmente.

b)   Designar dia e hora para a realização da audiência de tentativa de conciliação, manifestando o seu interesse pela autocomposição (inciso VII do art. 319 do CPC).

c)   Determinar o aperfeiçoamento da citação da ré, para que, querendo, apresente contestação no prazo legal, sob pena de revelia.

d)   Ao final, JULGAR A AÇÃO PELA PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS, reconhecendo a nulidade das cláusulas contratuais que autorizam a ré a corrigir as prestações e a calcular mensalmente os juros, e, consequentemente, o direito dos autores de pagarem as mesmas prestações com cálculo da correção monetária e dos juros anuais, condenando ainda a vencida ao pagamento da quantia de R$ 267.430,62 (duzentos e sessenta e sete mil quatrocentos e trinta reais e sessenta e dois centavos), correspondendo aos valores indevidamente cobrados dos autores entre maio de 2018 e agosto de 2020, em dobro (parágrafo único do art. 42 do CDC), permitida a compensação com valores a serem ainda pagos pelos demandantes, tudo acrescido de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que devem ser fixados no percentual máximo.

 

34.  Protestam provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, tais como a juntada de novos documentos e a realização de perícia.

 

35.  Dão à causa a quantia de R$ R$ 267.430,62 (duzentos e sessenta e sete mil quatrocentos e trinta reais e sessenta e dois centavos).

 

Nestes termos,

Pedem deferimento.

Rio de Janeiro, 02 de setembro de 2020.

 

Cristiano Vieira Sobral Pinto

OAB/RJ 117279

 

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