terça-feira, 9 de setembro de 2025

AULA 7: Religião e Religiosidade no Mundo Antigo

 


📌 O que é Religião?

  • Senso comum: muitas vezes associada ao termo religare, como ponte entre o mundo físico e o espiritual.

  • Visão ampliada: fenômeno humano de interpretação do mundo, com papel na construção de valores sociais.

  • Institucionalização: a religião envolve práticas reconhecidas coletivamente, não apenas ações individuais.

  • Função social: organiza crenças, valores e explicações por meio de lideranças (sacerdotes, profetas, líderes carismáticos).

    • Max Weber destaca que a liderança pode surgir:

      • da capacidade de explicar e difundir mensagens;

      • ou do carisma e reconhecimento de poderes especiais.


📌 O que é Religiosidade?

  • Diferente de religião, mas relacionada.

  • Refere-se a um conjunto de práticas e experiências individuais.

  • Está em constante ressignificação de símbolos e significados.

  • Exemplo: as fogueiras e árvores decoradas por povos nórdicos no solstício de inverno → adaptadas pelo cristianismo como árvore de Natal.


📌 Diferença essencial

  • Religião → Institucionalizada, organizada, coletiva, vinculada a lideranças e sistemas de crença.

  • Religiosidade → Vivência pessoal ou comunitária, mais fluida, reinterpretada em diferentes contextos históricos e culturais.


📌 Exemplos históricos

🌿 Mundo grego

  • Os deuses agiam de forma muito humana, com paixões e desejos.

  • Homens eram influenciados ou castigados por deuses como Apolo.

  • Essa relação entre deuses e homens formava parte da paideia (educação grega).

☀️ Zoroastrismo (Pérsia)

  • Dualidade: Ahura Mazda (verdade) x Arimã (mentira).

  • O equilíbrio entre forças era central.

  • Rei Dario I reinterpretou essa religião para legitimar seu poder político, associando-se à “verdade” contra inimigos.


📌 Conclusão

A religião no mundo antigo não pode ser vista de forma linear:

  • Era sempre reinterpretada conforme o contexto histórico e político.

  • Cumpria função de legitimação do poder, de explicação do mundo e de organização social.

  • A religiosidade, por sua vez, mostra como práticas simbólicas sobrevivem e se transformam em diferentes culturas e épocas.


📚 Antropologia do fenômeno religioso

🔹 Mito

  • Definição: tentativa de explicação de fenômenos naturais e sociais.

  • Não é mentira, mas uma forma simbólica de interpretar a realidade.

  • Função: transmite valores, hierarquias, disputas políticas e educa a sociedade.

  • Exemplo:

    • Cronos/Saturno devorando os filhos → metáfora do tempo e do poder.

    • Zeus rompe o ciclo e inaugura uma nova ordem → ideal de educação e cidadania na Grécia (paideia).


🔹 Rito

  • Definição: conjunto de práticas que tornam uma religião compreensível e reconhecida.

  • Função: cria pertencimento, reforça identidades e marca a diferença entre grupos.

  • Exemplos:

    • Cristãos que recusavam saudar o imperador romano como deus, sendo perseguidos.

    • Iconografia egípcia: coroa do faraó unindo Alto e Baixo Nilo, símbolo político e religioso.


🔹 Ciência

  • Definição: conhecimento religioso reconhecido, transmitido por especialistas que interpretam e dão sentido aos fenômenos.

  • Função: garante a autoridade das lideranças religiosas.

  • Exemplo:

    • José do Egito interpretando os sonhos do faraó (tradição judaico-cristã).

    • O valor não estava no sonho em si, mas na capacidade interpretativa do líder.


🔹 Magia

  • Definição: elemento religioso ligado ao extraordinário, ao sobrenatural, geralmente experienciado de forma individual.

  • Diferença:

    • Prática mágica → ação ritual de um indivíduo (pode ou não ser institucional).

    • Magia religiosa → reconhecida coletivamente como manifestação do divino.

  • Exemplo:

    • Milagre de Caná (água em vinho) → primeiro milagre de Jesus.

    • Reconhecido como sinal da escolha divina, mas também sentido de forma pessoal.


🔹 Síntese

  • O fenômeno religioso é composto por mito, rito, ciência e magia, que se entrelaçam:

    • Mito → explica.

    • Rito → materializa.

    • Ciência → legitima.

    • Magia → individualiza.

  • A combinação desses elementos fortalece instituições religiosas, que influenciam até quem não é praticante.

    • Exemplo: presença da cruz católica no STF como símbolo da moral cristã introjetada na sociedade brasileira.


📚 Sociologia da Religião

🔹 Weber: Religião, Sociedade e Ética

  • Obra central: A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo (1934).

  • Enfoque: mais importante que a doutrina é a conduta ética recompensada e valorizada socialmente → formação de um ethos.

  • Religião e mundo: relação de tensão → um dá sentido ao outro, mas também compete com ele.

  • Religião interage com: política, economia, cultura, estética, erótica e intelectual.

✦ Conceitos fundamentais

  • Ethos: síntese de costumes e traços que distinguem um povo.

  • Ascetismo:

    • Ação de renúncia no mundo.

    • O devoto como instrumento de Deus.

    • Forma de disciplina e racionalização.

  • Misticismo:

    • Busca de fusão com o sagrado.

    • Estado irracional, voltado ao além.

    • Evita agir na ordem do mundo.

✦ Agentes religiosos

  • Mágico → Profeta → Salvador (progressão carismática).

  • Carisma mágico: reconhecimento social de quem detém o poder de ligação com a salvação.

  • Esse carisma gera sistematização e racionalização da vida religiosa.

✦ Estruturação da religião (3 níveis)

  1. Propaganda de um salvador – mestre central, legitimado por algo especial.

  2. Controle do dogma – grupos organizados mantêm, adaptam e sofisticam a mensagem.

  3. Formação de sucessores – relações mestre/discípulo consolidam a continuidade.


🔹 Bourdieu: Campo Religioso e Legitimidade

  • Influenciado por Weber, mas com foco na reprodução das estruturas sociais.

  • A religião funciona como um sistema de bens de salvação controlados por especialistas.

✦ Conceitos centrais

  • Habitus: disposições sociais incorporadas, que moldam práticas e percepções.

    • No campo religioso, orienta o comportamento dos fiéis e legitima a visão dos dominantes.

  • Campo: espaço social de disputas por poder e legitimidade (no caso, o religioso).

  • Capital simbólico: prestígio, autoridade e reconhecimento acumulados pelas lideranças religiosas.

✦ Função da religião

  • Produzir, reproduzir e difundir bens de salvação (doutrinas, ritos, mensagens).

  • Reforçar a legitimação social de grupos dominantes.

  • Lideranças eclesiásticas → também líderes políticos, econômicos e intelectuais locais.

  • Busca do monopólio religioso e intelectual, que garante unidade e coesão interna.


🔹 Síntese Comparativa

AspectoWeberBourdieu

FocoConduta ética, ethos e racionalização da vidaEstrutura social, campo e reprodução

ReligiãoTensão com o mundo, carisma, ascetismo e misticismoSistema de bens de salvação controlado por especialistas

OrganizaçãoPropaganda do salvador, controle do dogma, sucessoresCampo religioso com habitus e capital simbólico
Função socialOferece sentido, disciplina e racionalidadeLegitima posições sociais e garante coesão do grupo




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