O advento do Estatuto do Idoso representa uma mudança de paradigma, já
que amplia o sistema protetivo desta camada da sociedade, caracterizando
verdadeira ação afirmativa em prol da efetivação da igualdade material. Daí a
importância do estudo do sistema jurídico de proteção ao idoso, tendo em vista
a sua relevância para a sociedade atual e para a futura, sendo extremamente
necessária a conscientização da população, no sentido de respeitar os direitos,
a dignidade e a sabedoria de vida desta camada tão vulnerável e até bem pouco
tempo desprezada da sociedade.
Num primeiro momento, tratar-se-á de analisar quem, afinal, pode ser
considerado idoso, para então, analisar o significado jurídico do Estatuto e
por fim, suas garantias fundamentais.
O sistema jurídico brasileiro deixou a desejar, visto que não há uma
coerência quanto à sistematização, o que traz certa dificuldade no que tange a
interpretação e aplicação das normas referentes aos idosos. Contudo, basta
observar a Lei 8.842, de 04 de janeiro de 1994, que dispõe sobre a Política
Nacional do Idoso e dá outras providências (regulamentado pelo Decreto 1.948,
de 03 de julho de 1996), que, em seu art. 2º, considera pessoa idosa aquela com
idade maior a 60 (sessenta anos).
O Estatuto do Idoso, Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, na mesma
linha, prevê expressamente a idade de 60 anos para que uma pessoa seja
considerada idosa. Porém, alguns direitos exigem dos idosos uma idade mais
avançada, v. g., o direito à gratuidade no transporte coletivo, que exige a
idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, vide art. 230, § 2º da Constituição
da República Federativa do Brasil de 1998 - CRFB/88.
Esta é também a idade exigida para obter prioridade na tramitação de
processos judiciais, de acordo com a Lei 10.173, de 09 de janeiro de 2001. Dessa
forma, na Lei de Organização da Assistência Social - LOAS, Lei 8.742, de 07 de
dezembro de 1993, que trata do pagamento do benefício da prestação continuada
ao idoso carente e sem renda para se mantiver ou for mantida pela família, a
idade fixada foi de 67 (sessenta e sete) anos, mas com a entrada em vigor do
Estatuto do Idoso, a idade passou a ser de 60 (sessenta anos).
No âmbito internacional, não há um regramento específico sobre o tema,
sendo muito escassos os documentos internacionais que façam referencia aos
idosos. É possível encontrar alguns artigos isolados, que tratam, basicamente,
de matérias relacionadas à previdência e seguridade social.
O Estatuto do Idoso tramitou durante 6 (seis) longos anos pelas casas do
Congresso Nacional até ser, finalmente, sancionado pelo atual Presidente da
República Luís Inácio Lula da Silva em 1º de outubro de 2003. Em suas normas,
encontram-se preceitos amplamente debatidos pela sociedade, revelando um
caráter protetivo dos direitos fundamentais desta parcela da população com
idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, cuja situação é extremamente
precária, seja no quesito aposentadoria, na dificuldade de transportes, ou de
recursos básicos para sobrevivência, como, moradia, saúde, lazer, educação,
entre outros.
Em declaração divulgada pela imprensa sobre o Estatuto do Idoso, o
Presidente da República afirmou que:
Seus 118 (cento e dezoito) artigos formam um
guarda-chuva de garantias legais que a sociedade devia aos seus idosos. A
partir de agora, eles terão uma ampla proteção jurídica para usufruir direitos
da civilização sem depender de favores, sem amargurar humilhações e sem pedir
para existir. Simplesmente viver como deve ser a vida em uma sociedade
civilizada: com muita dignidade. Mas para que tudo isso se materialize, é
preciso que esse instrumento de cidadania tenha a adesão de toda a sociedade,
porque só assim as inovações que ele traz - e as leis que ele regulamenta -
irão se transformar, de fato, em direitos na vida dos nossos idosos.
DAS AS GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Os direitos fundamentais do
idoso estão elencados nos Capítulos I ao X do Título II do novel diploma. Tais
direitos estão estribados sobre o direito constitucional vigente no Brasil,
além de estarem também presentes em outras leis, pontos a ser discutido mais
adiante.
O Capítulo I do Estatuto cuida, em seus artigos 8º e 9º, do Direito à
vida, onde o envelhecimento é tratado como um direito personalíssimo.
Observa-se que nos artigos 11 a 21 do Código Civil em vigor, estão
disciplinadas as normas inerentes aos direitos da personalidade, destacando-se:
a dignidade da pessoa humana; o respeito; a relação com o Estado e o Poder
Público; a questão da saúde, do transporte e da segurança; a liberdade física e
intelectual; entre outros.
Os direitos da personalidade caracterizam-se por serem irrenunciáveis,
irrestringíveis e inalienáveis. E assim, no tocante à proteção do idoso e do
ser humano referente à sua dignidade; os idosos devem ser protegidos por meio
do que chamamos de direitos sociais, passando estes a ter prioridade no
atendimento das políticas públicas, quais sejam: saúde, educação, moradia,
transporte, etc.
Pela leitura do artigo 9º da Lei 10.741/03 que diz:
"Art. 9º - É obrigação do Estado, garantir à pessoa idosa a
proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas
que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade",
Se for dever do Estado, conclui-se que a omissão de tais obrigações
ensejam medidas energéticas, como a instauração de inquérito civil para a
celebração de termo de ajustamento de conduta, propositura de ações civis
públicas, mandados de injunção e tantas outras medidas cabíveis. Ainda
encontramos assegurados os direitos à liberdade, ao respeito e à dignidade.
Aqui, mais uma vez, observa-se a grande influência de nossa Constituição
Federal, pois logo em seu artigo 3º, inciso IV, é estipulado como um dos
objetivos fundamentais de nosso País a promoção do bem de todos, sem
preconceito ou discriminação em face da idade do cidadão, bem como de raça,
origem, sexo, cor e quaisquer outros tipos de discriminação.
Outras garantias também são de extrema relevância para o estudo em tela,
sendo apontadas aqui, algumas de maior importância e que ensejam grandes
discussões: (a) O atendimento preferencial e imediato junto aos órgãos públicos
e privados que prestam serviços à população (exemplos.: bancos, correios e
outros órgãos públicos); (b) Garantia de acesso à assistência social e aos
serviços de saúde (eficiência no atendimento em hospitais públicos e
particulares); (c) O direito à pensão alimentícia, esta fornecida pelo Poder
Público, para famílias com dificuldades financeiras; (d) Estimulação de
empresas privadas com redução em suas cargas tributárias para a contratação de
pessoas que já estejam nesta faixa etária; (e) Transporte coletivo gratuito
para os que contam 65 (sessenta e cinco) anos, embora o tema seja tratado,
geralmente, por meio de leis municipais; (f) Prioridade na tramitação de
processos judiciais ou administrativos; (g) A polêmica dos planos de saúde que
não podem cobrar valores mais elevados para os idosos; (h) Redução da idade de
67 (sessenta e sete) para 65 (sessenta e cinco) anos para que os idosos
carentes se beneficiem com 1 salário mínimo, como previsto na Lei 8.742 de 7 de
dezembro de 1993 que dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá
outras providências (no Estatuto, vide art. 34); (i) Atendimento preferencial
no Sistema Único de Saúde - SUS; (j) O cidadão passa a ter a obrigação de
comunicar qualquer tipo de violação que o idoso vier a sofrer, às autoridades
competentes; (k) Prioridade nos programas habitacionais, sendo-lhes reservados
3% (três por cento) das anuidades e, finalmente, (l) As empresas prestadoras de
serviços públicos deverão ter em seus quadros um mínimo de 20% (vinte por
cento) de trabalhadores com 45 anos ou mais.
O legislador adotou o sistema da co-responsabilidade social, ligado ao
princípio da indissolubilidade do vínculo federativo, ou seja, os entes
federativos elencados no art. 46, não podem ficar inertes ante a defesa das
políticas de atendimento ao idoso. E mais, esses entes deverão trabalhar em
conjunto, de forma harmônica, sempre com vistas ao atendimento dos direitos dos
idosos.
A questão do acesso à justiça ganha dimensão especial com o advento do
Estatuto, reservando um capítulo inteiro só para tratar deste tema. Entretanto, desdobrando-se do acesso à justiça,
encontra-se a problemática de aperfeiçoar a duração de uma demanda aforada.
Neste introito, facilitar o acesso é ampliar o aparato judicial em benefício ao
idoso, disponibilizando instrumentos eficazes que possam solucionar os
conflitos e buscar o desiderato jurisdicional, qual seja a justiça.
Frise-se que no artigo 1211-A, pouca linha atrás
suscitado a prioridade do idoso no acesso à Justiça estava condicionada a idade
mínima de sessenta e cinco anos. Porém, com o advindo do Estatuto do idoso a
prerrogativa convalidou para o verdadeiro conceito de idoso presente no artigo
2° da Lei 8842/94, ou seja, agora o acesso à Justiça prioritário se dá àquele
que detenha idade igual ou superior a sessenta anos.
Em confirmação ao exposto, o STJ já esta
aplicando a concessão de prioridade na tramitação dos processos judiciais em
que figure como parte pessoa com idade igual ou superior a 60 anos em atendimento
a Lei 10.741 de 1º de outubro de 2003, o Estatuto do idoso.
Facilitar o acesso é solucionar as questões que
afrontam o plano da celeridade em encontro de seu objeto, a estabilidade
processual, permanecendo ao legislador ordinário a solução de tal critério, bem
como possibilitar maiores recursos aos idosos para a defesa de direitos que
entendam ser seus. É oportuno salientar que a celeridade não poderá ser arguida
em prejuízo de terceiros de boa-fé, ou permitir a realização de atos eivados de
nulidade e que atentem contra a regularidade processual disposta aos litigantes.
E assim, com uma simples maneira de azeitar essas
engrenagens que estão estagnadas, o Estatuto do idoso veio para fortalecer o
espírito da dignidade humana e dar forças à insegurança e sentimento de
inferioridade que transpassam num idoso. Com este enfoque fica para os
Tribunais a devida tarefa de continuarem efetivando as prerrogativas de acesso
à justiça prevista na Lei 10.741/03, em prol do indivíduo que por respeitáveis
anos figurou como pessoa de sinceros frutos para a sociedade e que agora
atravessa a fase da velhice.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA,
Dayse Coelho de. Estatuto do Idoso: real
proteção aos direitos da melhor idade?. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n.
120, nov. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4402>.
Acesso em: 12 de nov. 2014.
ANDRIGHI.
Fátima Nancy. O acesso do idoso ao
judiciário. Plenarium, Brasília, v.1, n.1, p.215-218, nov. 2004.
BRAGA,
Pérola Melissa Vianna. Envelhecimento,
ética e cidadania. Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 52, nov. 2001.
Disponível em: < http://jus.com.br/revista/texto/2389>
Acesso em: 12 de nov. 2014.
LENZA,
Pedro. Direito constitucional
esquematizado. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
Nenhum comentário:
Postar um comentário