A propriedade, no Direito Civil, consiste na
fruição plena e exclusiva, por uma pessoa, de um determinado bem.
A sua definição é, portanto, extraída das
prerrogativas que o domínio oferece: usar, gozar, dispor reivindicar a coisa de
quem quer que indevidamente a detenha.
Assim, o artigo 5º, inciso XXII, da Carta Magna
estabelece ser garantida aos brasileiros e estrangeiros a inviolabilidade do
direito à propriedade.
Por sua vez, no artigo 170 da Constituição Federal,
vê-se estipulado que a ordem econômica deverá observar vários princípios, entre
os quais a propriedade privada (artigo 170, inciso II).
Se assim o é, o condômino, dispondo de propriedade
constituída por vaga autônoma de garagem, não pode ser privado ou ter o seu
uso, fruição, disposição e reivindicação modificado por lei posterior.
Sendo assim, a aplicação do art. 1.338 do Código
Civil, diz respeito à locação de vagas de garagem a estranhos, para os
condomínios instituídos após o início da vigência da lei. 12.607/2012 dependerá
de expressa autorização da convenção, ainda que se trate de vaga de garagem
qualificada como fração ideal por uma questão de lógica e interpretação
sistemática.
Há, ainda, o dever de cumprimento daquelas
disposições aprovadas pelos próprios condôminos na Convenção do Condomínio, as
quais constituem lei particular do agrupamento dos integrantes deste, e estão
sujeitos a estrita obediência. Se ali constar que a porta externa do edifício
se feche a determinada hora, ou que determinadas pessoas não podem circular
pelo hall social, ou usar o elevador social, ou que nenhum condômino tem a faculdade de manobrar seu
carro na garagem comum, o que não podem permanecer crianças nos corredores, os
condôminos e seus locatários, todos os habitantes, em suma, são obrigados a
tais preceitos, sob as sanções impostas no mesmo regulamento ou convenção.
Trata-se, é bem verdade, de normas restritivas da
liberdade individual, mas, da mesma forma que toda vida em sociedade impõe a
cada um limitações à sua atuação livre em benefício do princípio social de
convivência, assim também naquele pequeno agrupamento de pessoas, que compõem
uma comunidade especial, adotando como normas convenientes à tranquilidade
interna desta certas limitações à liberdade de cada um em proveito da melhor
harmonia do todo, têm aquelas restrições e limitações um sentido de princípio
de disciplina social interna, de natureza cogente a todos os que penetram no
círculo social restrito.
Todavia,
a questão envolvendo o conteúdo da convenção não parece ter resposta simples
quando nela passam a ser previstas disposições que limitam o direito de
propriedade em verdadeiro confronto com a legislação ordinária e
constitucional.
Nestas hipóteses, as disposições estatutárias da
convenção não podem prevalecer. Isto porque, por mais necessário que seja o
respeito às regras internas e à autonomia da vontade dos “contratantes” que
decidiram impor ainda mais limitações à sua propriedade privada comum, tais
disposições convencionais não podem ultrapassar um limite tal que viole o
direito de propriedade do condômino ao ponto de desrespeitar a sua função
social e outros princípios constitucionais.
A utilização
do bom senso, do critério do bonus pater familiae é instrumento
adequado a auxiliar a solução de casos como estes. Não havendo prejuízo de grande
ordem, imediato e plenamente constatável, com a locação aos demais condôminos,
tal direito não poder ser negado, devendo, portanto, o condomínio lançar mão de
outros instrumentos legais para coibir os eventos que a regra pretendia evitar.
Com efeito, se é certo que a convenção do
condomínio é instrumento poderoso de legislação interna do bem comum, mormente
por se tratar regulamentação de uma propriedade privada – o que revela um
direito muito maior aos comunheiros de decidir o que é melhor para si dentro de
uma propriedade cujo acesso e utilização de áreas comuns pode ser severamente
limitado – certo é também que tal
instrumento deve respeitar regras de hierarquia superior, aí incluída a
legislação ordinária e a constitucional.
Cacoal-RO, 29 de março de 2017.
DANIELA BERNARDO VIEIRA DOS SANTOS
OAB/RO 7015
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