sexta-feira, 2 de maio de 2014

Modelo de Resposta à acusação



 Problema:

3)  Tício estava em sua residência, por volta das 18h00, quando ouviu um barulho que veio da casa vizinha e assemelhava-se a um barulho de vidro quebrado. Ao chegar à janela de sua residência, Tício observou que a janela da casa vizinha estava quebrada e que uma pessoa tinha acabado de entrar por ela. Como Tício sabia que os seus vizinhos normalmente só chegavam após as 19h00; e tendo dúvida quanto à ocorrência de um possível crime de furto, resolveu ligar para a autoridade policial competente e informar que viu uma pessoa entrando na residência do vizinho através de uma janela quebrada e que possivelmente iria cometer o crime de furto. O delegado de polícia competente enviou uma viatura para o local, tendo ocorrido o início de uma investigação policial, entretanto, descobriu-se que, na verdade, uma pessoa  tinha acidentalmente chutado uma bola de futebol na janela da residência vizinha e entrado nesta somente para pegar o objeto. Extremamente irritado com a situação, o delegado de polícia indiciou Tício pelo crime de denunciação caluniosa, art. 339 do Código Penal, tendo o promotor de justiça oferecido denúncia perante o juiz da 20ª Vara Criminal do Município Z. Este recebeu a denúncia e citou o réu para oferecer defesa. Tício  foi citado pessoalmente e contratou você como advogado. Nessa condição, redija a peça processual cabível, desenvolvendo todas as teses defensivas que podem ser extraídas do enunciado, com indicação de respectivos dispositivos legais.


Resposta à acusação (art. 396 do CPP)

Exigida com muita frequência no Exame de Ordem, a resposta é uma peça que comporta uma infinidade de teses e pedidos. Para que a abordagem seja a mais completa possível, veremos os temas, a seguir, individualmente.

396 ou 396-A?

Sempre há desentendimento quando o assunto é a fundamentação da resposta à acusação. Para mim, não há a menor dúvida de que é o artigo 396, pois o 396-A apenas traz o que pode ser alegado na peça. Para outros, todavia, a peça deve ser embasada no art. 396-A, e não no 396. Em Exame de Ordem, para não ter erro, é melhor citar os dois, ainda que isso custe alguns décimos. A correção da FGV tem sido tão grosseira que, caso a instituição adote apenas um dos artigos, não duvido que o examinador venha a aplicar zero para quem escolher o outro. Obviamente, caso isso ocorresse, a situação seria revertida após os recursos. Contudo, questiono: vale o estresse? Na dúvida, mencione os dois. Por fim, se o processo seguir o rito especial do júri, a resposta à acusação deverá ser fundamentada com base no art. 406 do CPP.

Obrigatoriedade

A ausência de resposta à acusação gera a nulidade do processo. Prova disso é o artigo 396-A, § 2º, que prevê a nomeação de defensor para a apresentação de resposta à acusação, caso o réu não o faça ou não constitua advogado no prazo legal.

Prazo

Deve ser contado nos termos do Enunciado n. 710 do STF: “No processo penal, contam-se os prazos da data da intimação, e não da juntada aos autos do mandado ou da carta precatória ou de ordem”. A informação é relevante para o Exame de Ordem, visto que a instituição costuma pedir o oferecimento da peça no último dia de prazo – portanto, essencial saber como contá-lo corretamente.

Se a citação for feita por edital, o prazo correrá somente a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. Enquanto não comparecer, o processo permanecerá suspenso, nos termos do art. 366 do CPP.

Resposta à acusação no juizado

O artigo 396 é claro ao afirmar que a peça é cabível nos procedimentos ordinário e sumário. No sumaríssimo, a Lei 9.099/95 prevê um trâmite próprio para o processo, sem a existência de resposta à acusação. Portanto, o dispositivo não é aplicável em processos que correm em juizado.

Artigo 395 do CPP

Segundo o entendimento majoritário, o “recebimento da denúncia se opera na fase do art. 396 do Código de Processo Penal” (HC n. 138.089-SC, STJ, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, publicado no DJ em 22.3.2010). Com base nisso, perfeitamente possível o pedido de rejeição da denúncia em resposta à acusação.

A OAB, na prova 2008.3, entendeu da mesma forma, tanto que exigiu, como tese de defesa, o pedido de rejeição da inicial com base na inépcia da denúncia (art. 395, I). Por isso, caso venha a ser cobrado novamente, não obstante a divergência doutrinária sobre o tema, não deixe de alegar o art. 395.

Nulidade (art. 564)

Também na prova 2008.3, a OAB exigiu uma tese de nulidade, nos termos do art. 564, II, do Código de Processo Penal, pois a parte seria ilegítima (ao final, comentários sobre a exceção de ilegitimidade). Portanto, caso volte a cair uma resposta à acusação, por não existir qualquer óbice à sua alegação, é possível que a banca traga alguma nulidade a ser arguida.

Absolvição sumária

Prevista no art. 397 do CPP, deve ser alegada exclusivamente em resposta à acusação. Não pode o dispositivo, em hipótese alguma, fundamentar pedido futuro de absolvição – em memoriais, por exemplo, quando a absolvição deve ser requerida com base no art. 386. 

A absolvição sumária deve ser imposta quando: a) existir manifesta causa excludente de ilicitude: basicamente, quando presente uma das três hipóteses do art. 23 do CP (legítima defesa, estado de necessidade e estrito cumprimento do dever legal); b) existir manifesta causa excludente de culpabilidade: é o caso, por exemplo, do erro de proibição (art. 21 do CP); c) o fato narrado evidentemente não constitui crime: sendo o fato atípico, não há razão para que se dê continuidade ao processo, sendo imperiosa a absolvição sumária; d) extinta a punibilidade: é o caso, por exemplo, da prescrição. As causas extintivas da punibilidade estão previstas no art. 107 do CP.

Sobre as hipóteses do art. 397, algumas ressalvas devem ser feitas. A primeira diz respeito ao inciso II, parte final, que trata da inimputabilidade. Segundo o dispositivo, o juiz não pode, em absolvição sumária, reconhecer a causa de isenção do art. 26 do CP. A segunda é em relação ao inciso IV, que não se trata, em verdade, de sentença absolutória, mas de declaratória de extinção da punibilidade. Contudo, em apreço à redação legal, em prova, peça a absolvição.

Testemunhas e demais provas

O art. 396-A afirma que, em resposta à acusação, “o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário”.

Em Exame de Ordem, a OAB tem fornecido os nomes das testemunhas que devem ser arroladas na peça. No entanto, caso o enunciado não os forneça, não deixe de arrolá-las. Para evitar a identificação da prova, diga apenas “Nome ...”. Não invente nomes!

Ademais, se o enunciado trouxer alguma situação em que a produção de prova pericial ou documental seja favorável à defesa, não deixe de requerê-la, pois certamente será objeto de quesito.

Exceções

As exceções (art. 95 do CPP) devem ser processadas em apartado, segundo o art. 396-A, § 1º, do CPP. Entretanto, em Exame de Ordem, não tem o menor cabimento exigir do examinando a elaboração de duas peças distintas, uma resposta e uma exceção. Caso o enunciado traga, por exemplo, uma suspeição, alegue-a no próprio corpo da resposta à acusação, ainda que o texto legal não ampare esse posicionamento. No Exame de Ordem 2008.3, a OAB trouxe uma tese de ilegitimidade que devia ser alegada em exceção. Entretanto, quem fez a exceção, reprovou. Por outro lado, quem alegou a ilegitimidade no própria resposta, obteve a respectiva pontuação.


Peça: 



EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 20ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE Z.











TÍCIO, já qualificado nos autos do processo n. ____ , vem, por seu advogado que está subscreve, perante Vossa Excelência, durante o prazo legal, oferecer RESPOSTA À ACUSAÇÃO, com fundamento nos artigos 396 e 396-A do Código de Processo Penal, pelas razões a seguir expostas:


I. DOS FATOS

O Réu estava em sua residência, quando por volta das 18h00, ouviu um barulho de vidro quebrando. Ao chegar na janela de sua residência observou que a janela da casa vizinha estava quebrada e que uma pessoa tinha acabado de entrar por ela. Como o Réu sabia que os seus vizinhos normalmente só chegavam após as 19h00 e tendo dúvida quanto à ocorrência de um possível crime de furto, resolveu ligar para policia competente e informar o ocorrido.

O delegado de polícia competente enviou uma viatura para o local, tendo ocorrido o início de uma investigação policial, entretanto, descobriu que, na verdade, uma pessoa tinha acidentalmente chutado uma bola de futebol na janela da residência vizinha e entrado nesta somente para pegar o objeto.

Extremamente irritado com a situação, o delegado de polícia indiciou o Réu pelo crime de Denunciação caluniosa, art. 339 do CP.


II. DO DIREITO


Entrementes, a respeitável peça acusatória não merece prosperar, pelas razões a seguir:

a) da inexistência da conduta do art. 339 do Código Penal:

A denunciação caluniosa, outrossim, é ato ilícito somente quando o denunciante sabe e tem consciência de que as imputações ao denunciado são falsas. Segundo o art. 339 do Código Penal, in verbis:

Art. 339 - Dar causa a instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.


 No caso dos autos, o contexto probatório constante dos autos demonstra que, o Réu na dúvida do que realmente estava acontecendo, informou a autoridade policial para que esta tomasse as providencias cabíveis. Em momento algum o Réu sabia que o invasor era inocente, tanto que, com a chegada da autoridade policial, o mesmo, apenas narrou os fatos e em momento algum imputou qualquer crime.

Como preleciona Guilherme de Souza Nucci: “Cremos presente o elemento subjetivo do tipo específico, consistente na vontade de induzir o julgador a erro, prejudicando a administração da justiça” (Código Penal Comentado. 6.ed. São Paulo: RT2006., v.4, p.285).

Assim dispõe o Art. 18 do Código Penal brasileiro:

Art. 18 - Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

É mister que o sujeito ativo saiba que o denunciado é inocente, razão pela qual o elemento subjetivo do tipo deve ser específico, o que não ocorreu no caso em tela, pois o Réu apenas teve a intenção de ajudar seu vizinho que poderia estar sendo vítima de furto.

Este é também o entendimento perfilhado pelos Tribunais, conforme se comprova da ementa abaixo transcrita:

APELAÇÃO. ART. 339, CAPUT, DO CP. CRIME DE DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. DOLO NÃO CARACTERIZADO. IMPROVIMENTO DO RECURSO DO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO.

Inexistindo provas acerca da existência do dolo, de imputar crime a alguém o sabendo inocente, que caracteriza o delito de denunciação caluniosa, impositiva a manutenção da absolvição. Recurso improvido. (Apelação Crime Nº 70054787130, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gaspar Marques Batista, Julgado em 22/08/2013).

III. DO PEDIDO


Diante do exposto, requer:

a)    Que seja absolvido sumariamente o réu, com fundamento no art. 397, III, do Código de Processo Penal. Caso, no entanto, não seja o entendimento de Vossa Excelência, requer a intimação e a oitiva das testemunhas ao final arroladas.



Nestes termos
Pede e espera deferimento.

Local / data

Advogado/OAB

Rol de Testemunhas

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