Problema:
3)
Tício estava em sua residência, por volta das 18h00, quando ouviu um
barulho que veio da casa vizinha e assemelhava-se a um barulho de vidro
quebrado. Ao chegar à janela de sua residência, Tício observou que a janela da
casa vizinha estava quebrada e que uma pessoa tinha acabado de entrar por ela.
Como Tício sabia que os seus vizinhos normalmente só chegavam após as 19h00; e
tendo dúvida quanto à ocorrência de um possível crime de furto, resolveu ligar
para a autoridade policial competente e informar que viu uma pessoa entrando na
residência do vizinho através de uma janela quebrada e que possivelmente iria
cometer o crime de furto. O delegado de polícia competente enviou uma viatura
para o local, tendo ocorrido o início de uma investigação policial, entretanto,
descobriu-se que, na verdade, uma pessoa tinha acidentalmente chutado uma bola de
futebol na janela da residência vizinha e entrado nesta somente para pegar o
objeto. Extremamente irritado com a situação, o delegado de polícia indiciou
Tício pelo crime de denunciação caluniosa, art. 339 do Código Penal, tendo o promotor
de justiça oferecido denúncia perante o juiz da 20ª Vara Criminal do Município
Z. Este recebeu a denúncia e citou o réu para oferecer defesa. Tício foi citado pessoalmente e contratou você como
advogado. Nessa condição, redija a peça processual cabível, desenvolvendo todas
as teses defensivas que podem ser extraídas do enunciado, com indicação de respectivos
dispositivos legais.
Resposta à acusação (art. 396 do CPP)
Exigida
com muita frequência no Exame de Ordem, a resposta é uma peça que
comporta uma infinidade de teses e pedidos. Para que a abordagem seja a
mais completa possível, veremos os temas, a seguir, individualmente.
396 ou 396-A?
Sempre
há desentendimento quando o assunto é a fundamentação da resposta à
acusação. Para mim, não há a menor dúvida de que é o artigo 396, pois o
396-A apenas traz o que pode ser alegado na peça. Para outros, todavia, a
peça deve ser embasada no art. 396-A, e não no 396. Em Exame de Ordem,
para não ter erro, é melhor citar os dois, ainda que isso custe alguns
décimos. A correção da FGV tem sido tão grosseira que, caso a
instituição adote apenas um dos artigos, não duvido que o examinador
venha a aplicar zero para quem escolher o outro. Obviamente, caso isso
ocorresse, a situação seria revertida após os recursos. Contudo,
questiono: vale o estresse? Na dúvida, mencione os dois. Por fim, se o
processo seguir o rito especial do júri, a resposta à acusação deverá
ser fundamentada com base no art. 406 do CPP.
Obrigatoriedade
A
ausência de resposta à acusação gera a nulidade do processo. Prova
disso é o artigo 396-A, § 2º, que prevê a nomeação de defensor para a
apresentação de resposta à acusação, caso o réu não o faça ou não
constitua advogado no prazo legal.
Prazo
Deve
ser contado nos termos do Enunciado n. 710 do STF: “No processo penal,
contam-se os prazos da data da intimação, e não da juntada aos autos do
mandado ou da carta precatória ou de ordem”. A informação é relevante
para o Exame de Ordem, visto que a instituição costuma pedir o
oferecimento da peça no último dia de prazo – portanto, essencial saber
como contá-lo corretamente.
Se
a citação for feita por edital, o prazo correrá somente a partir do
comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. Enquanto
não comparecer, o processo permanecerá suspenso, nos termos do art. 366
do CPP.
Resposta à acusação no juizado
O
artigo 396 é claro ao afirmar que a peça é cabível nos procedimentos
ordinário e sumário. No sumaríssimo, a Lei 9.099/95 prevê um trâmite
próprio para o processo, sem a existência de resposta à acusação.
Portanto, o dispositivo não é aplicável em processos que correm em
juizado.
Artigo 395 do CPP
Segundo
o entendimento majoritário, o “recebimento da denúncia se opera na fase
do art. 396 do Código de Processo Penal” (HC n. 138.089-SC, STJ, Rel.
Min. Felix Fischer, 5ª Turma, publicado no DJ em 22.3.2010). Com base
nisso, perfeitamente possível o pedido de rejeição da denúncia em
resposta à acusação.
A
OAB, na prova 2008.3, entendeu da mesma forma, tanto que exigiu, como
tese de defesa, o pedido de rejeição da inicial com base na inépcia da
denúncia (art. 395, I). Por isso, caso venha a ser cobrado novamente,
não obstante a divergência doutrinária sobre o tema, não deixe de alegar
o art. 395.
Nulidade (art. 564)
Também
na prova 2008.3, a OAB exigiu uma tese de nulidade, nos termos do art.
564, II, do Código de Processo Penal, pois a parte seria ilegítima (ao
final, comentários sobre a exceção de ilegitimidade). Portanto, caso
volte a cair uma resposta à acusação, por não existir qualquer óbice à
sua alegação, é possível que a banca traga alguma nulidade a ser
arguida.
Absolvição sumária
Prevista
no art. 397 do CPP, deve ser alegada exclusivamente em resposta à
acusação. Não pode o dispositivo, em hipótese alguma, fundamentar pedido
futuro de absolvição – em memoriais, por exemplo, quando a absolvição
deve ser requerida com base no art. 386.
A
absolvição sumária deve ser imposta quando: a) existir manifesta causa
excludente de ilicitude: basicamente, quando presente uma das três
hipóteses do art. 23 do CP (legítima defesa, estado de necessidade e
estrito cumprimento do dever legal); b) existir manifesta causa
excludente de culpabilidade: é o caso, por exemplo, do erro de proibição
(art. 21 do CP); c) o fato narrado evidentemente não constitui crime:
sendo o fato atípico, não há razão para que se dê continuidade ao
processo, sendo imperiosa a absolvição sumária; d) extinta a
punibilidade: é o caso, por exemplo, da prescrição. As causas extintivas
da punibilidade estão previstas no art. 107 do CP.
Sobre
as hipóteses do art. 397, algumas ressalvas devem ser feitas. A
primeira diz respeito ao inciso II, parte final, que trata da
inimputabilidade. Segundo o dispositivo, o juiz não pode, em absolvição
sumária, reconhecer a causa de isenção do art. 26 do CP. A segunda é em
relação ao inciso IV, que não se trata, em verdade, de sentença
absolutória, mas de declaratória de extinção da punibilidade. Contudo,
em apreço à redação legal, em prova, peça a absolvição.
Testemunhas e demais provas
O
art. 396-A afirma que, em resposta à acusação, “o acusado poderá arguir
preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer
documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar
testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando
necessário”.
Em
Exame de Ordem, a OAB tem fornecido os nomes das testemunhas que devem
ser arroladas na peça. No entanto, caso o enunciado não os forneça, não
deixe de arrolá-las. Para evitar a identificação da prova, diga apenas
“Nome ...”. Não invente nomes!
Ademais,
se o enunciado trouxer alguma situação em que a produção de prova
pericial ou documental seja favorável à defesa, não deixe de requerê-la,
pois certamente será objeto de quesito.
Exceções
As
exceções (art. 95 do CPP) devem ser processadas em apartado, segundo o
art. 396-A, § 1º, do CPP. Entretanto, em Exame de Ordem, não tem o menor
cabimento exigir do examinando a elaboração de duas peças distintas,
uma resposta e uma exceção. Caso o enunciado traga, por exemplo, uma
suspeição, alegue-a no próprio corpo da resposta à acusação, ainda que o
texto legal não ampare esse posicionamento. No Exame de Ordem 2008.3, a
OAB trouxe uma tese de ilegitimidade que devia ser alegada em exceção.
Entretanto, quem fez a exceção, reprovou. Por outro lado, quem alegou a
ilegitimidade no própria resposta, obteve a respectiva pontuação.
Peça:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 20ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE
Z.
TÍCIO, já qualificado nos autos do
processo n. ____ , vem, por seu advogado que está subscreve, perante Vossa
Excelência, durante o prazo legal, oferecer RESPOSTA À ACUSAÇÃO, com fundamento nos artigos 396 e 396-A do
Código de Processo Penal, pelas razões a seguir expostas:
I.
DOS FATOS
O
Réu estava em sua residência, quando por volta das 18h00, ouviu um barulho de
vidro quebrando. Ao chegar na janela de sua residência observou que a janela da
casa vizinha estava quebrada e que uma pessoa tinha acabado de entrar por ela.
Como o Réu sabia que os seus vizinhos normalmente só chegavam após as 19h00 e
tendo dúvida quanto à ocorrência de um possível crime de furto, resolveu ligar
para policia competente e informar o ocorrido.
O
delegado de polícia competente enviou uma viatura para o local, tendo ocorrido
o início de uma investigação policial, entretanto, descobriu que, na verdade,
uma pessoa tinha acidentalmente chutado uma bola de futebol na janela da
residência vizinha e entrado nesta somente para pegar o objeto.
Extremamente
irritado com a situação, o delegado de polícia indiciou o Réu pelo crime de
Denunciação caluniosa, art. 339 do CP.
II. DO DIREITO
Entrementes, a respeitável peça acusatória não
merece prosperar, pelas razões a seguir:
a) da inexistência da conduta do art. 339 do Código
Penal:
A
denunciação caluniosa, outrossim, é ato ilícito somente quando o denunciante
sabe e tem consciência de que as imputações ao denunciado são falsas. Segundo o
art. 339 do
Código Penal, in verbis:
Art.
339
- Dar causa a instauração de investigação policial, de processo judicial,
instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de
improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe
inocente:
Pena
- reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa.
No caso dos autos, o contexto probatório
constante dos autos demonstra que, o Réu na dúvida do que realmente estava
acontecendo, informou a autoridade policial para que esta tomasse as
providencias cabíveis. Em momento algum o Réu sabia que o invasor era inocente,
tanto que, com a chegada da autoridade policial, o mesmo, apenas narrou os
fatos e em momento algum imputou qualquer crime.
Como
preleciona Guilherme de Souza Nucci: “Cremos
presente o elemento subjetivo do tipo específico, consistente na vontade de
induzir o julgador a erro, prejudicando a administração da justiça” (Código
Penal Comentado. 6.ed. São Paulo: RT2006., v.4, p.285).
Assim
dispõe o Art. 18 do Código Penal brasileiro:
II - culposo, quando o
agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.
É
mister que o sujeito ativo saiba que o denunciado é inocente, razão pela qual o
elemento subjetivo do tipo deve ser específico, o que não ocorreu no caso em
tela, pois o Réu apenas teve a intenção de ajudar seu vizinho que poderia estar
sendo vítima de furto.
Este
é também o entendimento perfilhado pelos Tribunais, conforme se comprova da ementa
abaixo transcrita:
APELAÇÃO. ART. 339, CAPUT, DO CP.
CRIME DE DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. DOLO NÃO CARACTERIZADO. IMPROVIMENTO DO RECURSO
DO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO.
Inexistindo provas
acerca da existência do dolo, de imputar crime a alguém o sabendo inocente, que
caracteriza o delito de denunciação caluniosa, impositiva a manutenção da
absolvição. Recurso improvido. (Apelação Crime Nº 70054787130, Quarta Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gaspar Marques Batista, Julgado
em 22/08/2013).
III. DO
PEDIDO
Diante do
exposto, requer:
a) Que seja absolvido sumariamente o
réu, com fundamento no art. 397, III, do Código de Processo Penal. Caso, no
entanto, não seja o entendimento de Vossa Excelência, requer a intimação e a
oitiva das testemunhas ao final arroladas.
Nestes
termos
Pede
e espera deferimento.
Local
/ data
Advogado/OAB
Rol de
Testemunhas
1. Nome
…, endereço ….
2. Nome
…, endereço ….
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